Há mais de um ano não escrevo no blogue. Tantas coisas aconteceram, tantas... Hoje, no entanto, não planejo fazer retrospectivas, mas falar sobre um tema vivo e ainda pouco claro para mim.
Pela enésima vez, assisti a "Closer" (2004). Várias coisas vieram a minha cabeça no que diz respeito às relações humanas, às minhas, propriamente ditas. O quadrado amoroso do filme e suas desventuras me fizeram pensar sobre o peso do haver de dois corpos tentando ir além do biológico e aparentemente urgente; de como, certas vezes, vamos todos nos perdendo por não detectar pontos problemáticos em nós mesmos; e de como, no fundo, tudo se esmaece no espelho.
Conversando com uma amiga - e também recorrendo a algumas de minhas últimas experiências de vida ligadas ao tema -, comecei a cismar sobre cada uma das personagens. Falei com a amiga sobre como via em Anna (personagem interpretada por Julia Roberts) uma fraqueza de identidade tão recorrente em muitos de nós, que faz com que nos deixemos levar sem questionarmos se o que está sendo feito nos faz realmente bem, como energia de vida; como observava em Larry (interpretado por Clive Owen) uma personalidade extremamente infantil de posse em relação a quem ele visualizasse como 'inimigo', ação que também fazemos pela - talvez - profunda insegurança alimentada a cada dia do ciclo despertar- produzir-recarregar; Ademais, tratei das duas figuras, as quais, em minha opinião, destacaram-se mais na narrativa: Alice (vivida por Natalie Portman) e Daniel (interpretado por Jude Law).
Eu vi nos dois coisas que tanto me perseguem e, acredito, persigam muita gente. Daniel foi uma das representações humanas mais intrigantes que já vi, dado seu pretenso amor por Alice e Anna. Na verdade, eu não vi ali amor (como eu o entendo) algum - como ele tanto alardeava para ambas separadamente -; mais pareceu um retrato bem construído do que é a paixão. Não duvido que ele tenha realmente gostado de cada uma delas, e poderia considerar que, a sua maneira, ele as tenha 'amado', entretanto, o que mais chamou minha atenção foi ele não se importar com as consequências que a realização de seus desejos traziam. Como homem das palavras, Daniel parecia não dar tanta atenção ao cálculo e à parcimônia, em outros termos, ao respeito: envolveu-se com a misteriosa Alice e, ao mesmo tempo, não se conteve em conquistar a altiva Anna. Quando sua paixão não era completamente correspondida, em sua percepção, Daniel se investia de grande energia para ser bem-sucedido na realização de seus desejo. A questão era sempre esta: seu desejo, seu sentimento, que deveria ser completado, preenchido. A busca incessante pela 'completude' fazia com que o jornalista sempre quisesse o máximo de cada relação, mas sem se importar em fazer o mesmo com as pessoas envolvidas.
Alice começou o filme com sua já memorável frase "Hello, stranger!", ou melhor, "Olá, estranho!": uma frase extremamente representativa do momento no qual estavam inseridos os quatro amantes. Ela, a mais jovem dos quatro, pareceu-me ser a mais fresca também: sempre leve e vaporosa, suas ações correspondiam a alguém que se entregava à vida, indo de cabeça, sem olhar para os lados. A seu modo, Alice mostrava uma sinceridade desconcertante cuja manifestação fazia com que me perdesse no que era real ou criação para não dificultar as coisas. Alice mentia, mas sentia e chorava com questionamentos tão abertos e francos, revelando, assim, um lado infantil positivo, o de não deixar de fingir por pressões além do que seu próprio ser suportasse. Eu vi nela uma entrega total a Daniel, a despeito de, nas entrelinhas, parecer haver saído de uma experiência complicada anteriormente. É inesquecível a cena em que, deitada, declara não mais amar seu amor porque não entendia "onde" ela a amava. Este foi uma dos momentos que mais me desarmaram no filme.
Por meio de Daniel e Alice pensei em como minha vida e meus problemas com alguns relacionamentos têm a ver com as condutas dramatizadas. Durante algum tempo, eu pensava que tudo em minha vida deveria ser 'total' e estendi isso às relações com o outro. Hoje, percebo que, no fundo, isso do 'total' acabava por eufemizar meu sentimento de controle sobre todas as coisas do mundo - a sensação de ser dono de mim e, por extensão, das coisas que me rodeiam. Assim, com isso de 'total', eu acabava por querer ter o domínio das coisas e, claro, moldá-las a meu desejo, ainda que com uma intenção aparentemente boa, isto é, uma de construção e preservação da harmonia (onde eu seria o próprio demiurgo). O objetivo de tudo isso: facilitar meu modo de lidar com outro, para facilitar minha vida... It's all about me... again... Hehehe! Não. Não é um problema fatal esse modo de viver, porém ele traz repercussões que arruinam as relações. Eu, por exemplo, quis sempre que me contassem coisas que eu considerava estarem sendo ocultadas, fosse porque justificava a mim mesmo (a ao outro) ser um ato de preocupação e ajuda, fosse por não conceber a presença da dúvida em uma relação intitulada, por mim mesmo, como 'real' ou 'verdadeira'. Acontece que, como mencionei, agora, mais friamente, julgo que tudo sempre teve a ver comigo. Sou eu querendo uma verdade que, muito provavelmente, só me fará sentir pleno, como senhor da vida do outro, ao conseguir adentrar campos exclusivos escuros (e obscuros) que dificultam a desejada completude, a direcionada à perfeição - àquela perfeição de uma relação ideal... do ideal. Assim, penso que a conduta egoísta só me afasta daqueles/as que que amo por não respeitar o oculto, o que não me é possível ou permitido acessar. Talvez alguns temas ocultos sirvam para registrar uma individualidade que vai se amenizando quando uma relação a dois passa a ser forte e cada vez mais enlaçada. Vejo que querer a completude é intentar alcançar o ideal, que, por si só, é conhecido por ser inatingível.
Desse modo, vale a pena esforçar-se para tentar levar uma vida mais leve. Penso a cada dia, mesmo depois de deterioradas algumas relações, o quanto é preciso ser e deixar ser. Muitas vezes, por essa busca "pelo que está escondido", a gente acaba por não observar e valorizar o que se tem de concreto e brilhante na troca com o ser diferente que está posicionado na vida naquele momento específico. Vale a pena sim ser cada vez mais honesto e verdadeiro, mesmo que isso custe o fim, o rompimento. Acredito que detectar quais percurso conduzem a um lugar de desterro é vital para poder levantar todos os dias e agradecer a Deus por estar vivo e por ter uma existência. As pressões estão sempre ativas e é bom estar atento/a a elas e, ainda mais, como você acaba sendo atingido por elas.
Com esta reflexão volto ao blogue. Sinto que novos ventos estão por vir, por soprar e me levar a novos campos. Eu quero cada vez mais me sentir preparado para seguir no Caminho que está todo a minha frente. Caminhando!