terça-feira, 29 de junho de 2010

Conversa comigo

Eu, novamente, aqui. Após relutar, estou aqui. Nessas três semanas que separam a última vez que escrevi desta, mais redemoinhos vieram. Fui levado por ventos sorrateiros e indecisos; terminei derrubado. Mas havia "Como la Cigarra" e, assim, estou levantando-me, evitando desesperar. Dias e dias com perguntas existencialistas e dúvidas fúteis.

A relutância acontece quando venho desenvolver pensamentos, e concretizá-los através de palavras. Fico diante de uma situação interessante na qual as coisas têm de ser para valer ou, simplesmente, não devem ser. Eu não sei se estou sendo o meu "real característico", uma vez que ando desviando-me dele; no entanto, questiono-me, "será possível desviar-se de si mesmo por muito tempo?" A coisa boa dos reveses são os seus profusos resultados. É impossível não ser diferente depois deles. A gente deve mudar; Deus! A gente precisa tanto mudar... Eu vou mudar.

Nesses dias de Copa tudo está bem animado: o Brasil fica mais Brasil e todos estamos tão brasileiros. Ontem houve mais um jogo e, com ele, os palpites, expressões de sofrimento e êxtase, os xingamentos e tudo mais que o mundo inteiro faz, vê na tevê e repete quadrienalmente. Eu tive de ir trabalhar. Vi as ruas desertas e por algum momento perdi-me no espaço, na contemplação de um "Ensaio sobre (...)" algo que estava desenhando-se na criatividade de um fim de tarde cinza e envolvente. O táxi deu R$10,00. O meio dá subsídios ao homem: eu ando encorajado. Coisas que vejo, músicas que ouço têm dado a mim ânimo. As pessoas permanecem iguais, talvez porque eu continuo o mesmo: o que segue não dando tantos dados. Parece que as coisas vão caminhando; se você para, elas seguem andando.

Ainda olho para o alto, no rastro do que é brilhante, contudo com mais consciência de que sou incomum. Agir ciente é outra coisa: um inferno - por vezes -, mas também - em simultâneo - uma luz ou, para os mais realistas, uma lanterna. Preciso muito das pessoas, porém, algumas vezes, penso que tenho necessidade de pessoas. Eu não aceito isto! Sinto-me como em um jogo de esconde-esconde com a definição. Tenho problemas com a limitação e limites. Brinco de divagar, crio um campo para a distração. Tudo para mim deveria ser cor-de-rosa, ou melhor, azul. Adoro o azul. É um desvio para mim, uma ponte de ligação, na verdade. Quando estou diante do azul sinto-me em apuros por ser vínculo de algo com alguma coisa à qual não desejo tanto pertencer. Nota-se o que acontece quando entro em contato com o azul.

Amanhã é um dia de possíveis novidades, mas não quero ir dormir cedo. Acho que no mês que vem vou começar a fumar. Está chovendo e a fumaça junina está incomodando o meu nariz. Eu odeio fumaça, mas tem a história da linha "tênue" que divide el amor y el odio. Uma frase tão usada. Sei lá. Acho que nem gostaria tanto de cigarros, ainda que, pelo visto, necessite de pessoas. Acho que não preciso tanto assim do fumo.

Este texto deveria ser diferente, mas os dedos apontam uma direção conhecida. Uma pena. Só eu entendo.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Mon doux enragé

"Não se cale nunca." Foi esta frase que fechou um recado de preservação de amizade. Há algum tempo estou querendo escrever sobre algo assim.

A explicação destas palavras vem da impressão que se sente das coisas estarem chegando a um estado complicado de se intitular, mas impossível de passar desaparcebido. Sabe-se apenas que ele está lá. Já senti isso algumas vezes na vida. Nós conhecemos pessoas, convivemos com elas e é no processo de troca que se apercebe o quanto serão na nossa existência: se apenas (boas ou más) lembranças ou se nos acompanharão, de uma forma ou de outra. Em alguns trechos do Caminho tive a chance de encontrar pessoas e pessoas. Este texto é uma mescla de saudosismo (ingrediente constitutivo, e permanente, deste blog) e percepção.

Faz pouquíssimo tempo, eu estava pensando em como cambiar o mundo, assimilando a indignação que certos professores me mostravam através dos autores e seus textos em análises apaixonantes. Estava no meio mais propício para encontrar os que, como eu, viam-se envoltos pela possibilidade da mudança, daquele sonho dourado de "fazer a diferença". Então eram discursos e pessoas inebriantes, impulsivas e donas da verdade, ou seja, a tradução mais plena da segunda juventude em seu brotar. Eu estava ali, no momento único e feliz do reconhecimento de afinidades; senti o cheiro, aproximei-me e bebi (ainda que usando de parcimônia) da doce fonte da juventude, de algo cuja vivência não tivera desde então. Vislumbrei a iminência de ser mais do que acreditava e fazer mais do que fizera até aquele ponto, de encontrar a diferença em meio à massa cimenteira. Naquele momento, posso, sem medo, dizer, vivi: amei e odiei, maltratei e fui maltratado, aprendi a ser humano, a ver ilusões nascer e ser abortadas; vingar, crescer e frutificar ou, simplesmente, morrer. Todos fomos culpados e, ao mesmo tempo, inocentes por tudo o que passou e nos aconteceu. Éramos tão jovens.

O período em questão proporcionou a mim experiências através de pessoas especiais, charmosas, inteligentes, de asas. Ah, como admirei aqueles seres! como os odiei por não serem fiéis a tudo o que me faziam acreditar e, por conseguinte, mostrarem-se contraditórios. Eu era assaz correto. Eu lutava contra a contradição. Para mim, ser contraditório era um subterfúgio aos que não se esforçavam para alcançar o difícil. Eu queria tanto achar pessoas que não se contentassem com o fácil. Mantive-me agarrado de tal maneira à ideia que, aos poucos, afastei-me daqueles sentenciados por mim. Veio depois Platão e ferrou com o resto[...].

É inarrável - se ela existir - a síntese das emoções sentidas por mim ao descobrir quão doce é amar e como é agoniante a fuga do ódio. A mistura de sentimentos foi uma constante, uma vez que acreditava nas palavras, esforçava-me para ser como os jovens da diferença, eu ouvia-os, quis estar com eles e terminei por sentir-me como José no Egito, ora iludido, ora solitário e irado. O que deveria fazer com os textos que havia lido, com as ideias cridas por mim e com as então malditas possibilidades? Eu não sabia: vi-me, novamente, rejeitado e, ainda por cima, agregado a novos fantasmas. De fato, ainda estou aprendendo a dar direção àquelas possibilidades, a ver que não são, de forma alguma, malditas. Elas são cargas que jamais planejara no percurso, mas que atualmente fazem parte da minha bagagem. Mais um aprendizado.

Ora me dou conta do fechamento daquele ciclo. Com ele foram as paixões e os deslumbres. Algumas vezes, penso estar crescendo - ou, sendo menos eufêmico, envelhecendo - e que aquele fogo deixou uma cicatriz a qual me traz lembranças de luta, como as de batalhas necessárias para delimitações irremediáveis. Quanto a lutar contra as contradições, não me atrevo, qual outrora, a ser tão severo com as pessoas humanas (exigindo delas a retidão platônica, afinal - parafraseando Saint-Exupéry - só se pode dar aquilo que se tem), pois descobri a minha humanidade por meio delas. Sendo assim, sempre as amarei, elas estarão sempre comigo. Rememorando, aprendo, a cada dia, a lidar com as minhas próprias contradições.

Sinto que mais um ciclo está por se fechar. Sinto que as coisas, mais uma vez, estão convergindo para uma nova realidade, um novo tempo para o qual tenho de me preparar. A imagem de casas rapidamente visitadas e acenos de despedidas rondam a minha cabeça. É o vislumbre de novo percurso.

Este texto, na verdade, é uma homenagem a todos os meus mais pujantes amigos e a um, em especial. Suas atitudes sempre me fizeram acreditar e me apaixonar, posto que via no seu esforço pueril uma luz, uma teimosa esperança de mudar - o que talvez nem mesmo ele atentava, mas que não lhe permitia a quietude mórbida dos jovens da nossa geração-. Fui a sua testemunha, vi o brilho nos seus olhos nas horas de luta, vi-o no mais exuberante da sua juventude. Brigamos e reatamos em simultâneo: senti o amor dele por mim. Eu respirei os ventos de vigor decorrentes das suas asas, apreciei seu insistente engajamento nos alistamentos aos campos do pertencer a algum lugar: ainda que fosse o trajeto escuro e lhe faltasse uma das pernas, sua esperança era a de encontrar o lar de objetos não-identificados conduzidos por soldadinhos de chumbos e bailarinas. Meu Tchaikovsky disfarçado de ave de rapina, siga, por favor, o conselho que inicia este texto. Sinto falta da sua alma de poesia.