domingo, 30 de novembro de 2008

Mitad

Escrever bem para mim é definitivamente ser visceral. Há momentos propícios para as boas letras. Certa vez, assistindo a uma aula de literatura portuguesa, da qual gostei bastante -raro evento, pois não sou adepto da literatura lusa, pelo menos da passada até agora a mim -, ouvi algo do que falava a apaixonada Mariana Alcoforado, uma coisa que me chamou muito a atenção. Em uma de suas poesias, ela dizia que seus melhores momentos eram os que a felicidade estava longe de si, pois, naqueles, seus olhos não estavam nublados pelo sentimento eufórico. Quando ouvi a professora ler isto me veio a sensação de que eu era também partidário do pensamento da noviça: eu não produzo bem estando "bem". Pode parecer uma conclusão negativa, no mínimo ambígua, mas é uma realidade. Neste momento estou com um sentimento familiar a mim, que me faz vir aqui e escrever para que me sinta de alguma forma bem, ou seja, andando na tenuidade da contradição, ou não. Escrever quando estou mal nada mais é do que uma tentativa de ficar bem. Agora estou ouvindo a voz maravilhosa de Rosa Passos, numa madrugada de sábado (para domingo) e sozinho. Tudo escuro. Estou escrevendo. Em minha companhia Dindi... "Você não existe Dindi...".
Minha rotina tem me feito emburrecer. Não sento para ler, nem para escrever. Não consigo esconder o meu descontentamento de viver rodeado de cabeças de vento, de pessoas que me contaminam com as doenças do mundo, que me transformam em massa. Eu não posso fazer mais do que a força que tenho no momento. A vida não tem sido atraente para mim, pois tem se mostrado uma sucessão de figurinhas repetidas, burras, chatas e eu me tornando afim. Triste. Não suporto estar na companhia das pessoas, elas me fazem atuar, ser como elas e eu sempre pensando, me policiando, para não me dizer melhor que elas, me excluir quando no fundo o que quero é de fato me subtrair de tudo.
Certa vez escrevi aqui minha alegria em me perceber humano, fraco etc., contudo vejo que sou assim, mas que não posso me resumir a isso e fazer da vida uma sucessão de segundos, minutos e horas e nada além. Na verdade, me sinto como alguém que não gosta de quartos; numa dualidade, sinto que preciso de regras para domar a fera dentro de mim, uma que tenho medo, pois nunca a deixei livre dos limites que eu mesmo impus. Não nasci para estar preso, posto que viva numa maneira trilhada e tida por muitos como exemplar, no íntimo não é assim. Há tanto em mim, eu sou tantos. É uma metade a que está visível e ela está já se contaminando e espalhando uma peste para as outras que, presas, não acham força para resistir além da sua capacidade. "Sei pensar, sei jejuar , sei esperar" foi assim que Sidharta se definiu quanto a sua pessoa; eu preciso ler mais Sidartas, conhecer Sidartas, estar mais com Sidartas. Onde estão vocês? Eu preciso viver e lutar contra o comum. Mesmo que me odeiem, que me machuquem e que me causem fissuras, tenho de pensar. Ainda que me mostrem apenas as maravilhas do mundo e que me dispensem os melhores elogios, tenho de jejuar. Até me vendo diante da demora do resultado, sentindo o ácido lento do tempo corroer as coisas e querendo calmar o insuportável a mim, preciso esperar.
é um trabalho; viver é ser exigido em força e intelecto. Não quero estar sentado, correndo do tempo feito um cervo amedontrado, não quero ficar assim.

"toda a gente pode alcançar o seu objetivo se souber pensar, esperar e jejuar."
(Sidarta, de Hermann Hesse)

domingo, 23 de novembro de 2008

Soñando con serpientes...

"Hay hombres que luchan un dia y son buenos
Hay otros que luchan un año y son mejores
Hay quienes luchan muchos años y son muy buenos
Pero hay los que luchan toda la vida
Esos son los imprescindibles"

(Bertolt Brecht)

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Contra o Verso

Estou feliz. Feliz por fazer parte de um dia que vai ficar para a História, mas para a de todos. Hoje soube da notícia que está sendo carro-chefe de toda a imprensa mundial: pela primeira vez na história dos EUA, maior potência econômica global, um presidente negro foi eleito. Isto é uma espécie de assombro, visto que se trata de um país de histórico limítrofe com o de ódio e perseguição racial mundial, conhecido pela maioria das pessoas e blá, blá, blá...
Pra mim o que importa mesmo é outra coisa: é constatar como nada é definitivo, que tudo é suscetível de mudança. Isso me faz recordar "Sidarta", em como vi neste livro o quanto o mundo é parecido com um rio. O mundo é um rio. É inconstante e imprevisível. Debalde tentemos aprisioná-lo em conceitos, nunca seremos capazes de vaticinar determinismos, pois eles não há. Reside aqui a minha alegria, na nossa maravilhosa impotência de controlar as coisas. Recomendo "Boa sorte/Good luck" ao Mr. Obama! Do fundo do meu coração.
Sidarta, Obama, enfim, uma mistureba muito particular. Na realidade, bom saber dessa notícia, pois me deu vontade (forte mesmo) de voltar a escrever. Ando muito assoberbado esses últimos dias, parecido com o coelho branco do livro de Lewis Carroll, e também cheio não só de ocupações, mas de algumas coisas que ando observando nesse monte de tempo que passei sem vir aqui. Engraçado, a gente sempre quer ter amizades, encontrar amizades, estar rodeado delas, então, na maioria das vezes, a gente acha o desejado... e aí? É só se preparar pra aprender, de todas as formas possíveis: estranhas, positivas, negativas, enfim de todas. A gente vai. Tenta. Não dá. Logo as dúvidas surgem: a culpa é minha ou deles? Tenho de mudar ou eles, se realmente gostassem de mim, não deveriam me aceitar do jeito que sou? Sou um chato ou um diferente? Perguntas sem respostas breves. Eis que se mostra o lado negativo do aprendizado.
No entanto, cabe a nós colocar em prática o que foi aprendido outrora com um francês bastante atento, isto é, urge ser lavoisierano e pegar do lodo a sua fertilidade. São os conceitos, são apenas conceitos, mas nós os levamos conosco e às vezes é interessante retirá-los do bolso, dar-lhes uma mexida, depois uma assopradinha e ver se servem. É preciso mudar? Sim, mas, mesmo dando minha mão direita a Heráclito, darei a esquerda a Parmênides, uma vez que percebi, tristemente, que o mundo é dotado de fortes oposições e que você deve de algum modo ir por um caminho. Por essa razão a pergunta da necessidade de transformar-se. Deve assumir uma postura frente a tudo o que passa por você e envolver a insígnia em seu braço direito, assim todos saberão quem é sem precisar realmente escutar o que você tem a dizer; um triste dever que se você não fizer, alguém o fará no seu lugar.
Talvez cada passo desse caminho esteja me fazendo crescer, ou seja, enxergar coisas que não são iguais às que estavam na porta de casa quando da minha saída. Às vezes dói ter de crescer, ter de endurecer, mas, num mundo de feras, construir crisálidas ajuda a nos proteger, a observar, a não se machucar. Não se vive de poesia, o que se tem é o concreto, sem suavizações, sem metáforas. O mundo que eu vejo não tem metáforas. Estou triste.