sábado, 31 de dezembro de 2011

Fuga no. 2(011)

Uma das músicas da minha vida começa assim: "Hoje, eu vou fugir de casa, vou levar a mala cheia de ilusão...". Desde ontem, eu venho tentando achar um modo de sintetizar 2011. Não consigo. Este foi um ano que não coube em si porque explodiu em um espaço azul.


Diversas coisas legais aconteceram durante o ano de 2011: (entre outras coisas) eu comecei a estudar disciplinas relativas às minhas preferências no mestrado; saí de um lugar ruim para um verdadeiro paraíso particular; viajei muito, inclusive para fora do país; consegui a minha bolsa e casa para dedicar-me aos estudos. Enfim, coisas que me fazem retirar do ano um saldo extremamente positivo.

Este ano foi caracterizado por participações especiais na minha vida. Recebi visitas de Aracaju, amigos que tinham algo para fazer aqui em Brasília. A breve presença deles foi um calmante para os tempos de solidão pelos quais passei. Poderia dizer que 2011 foi um ano azul escuro: lindo, firme, contudo solitário. Se em 2010, eu senti, neste ano, eu vivi a solidão, eu a vi maturando-se, de diferente formas eu estive sozinho, ainda que protegido. Ora quando não estava com ninguém, ora em momentos em que estava cercado de pessoas que de tão ligadas - mesmo sem querer - me isolavam ao lembrar-me acidentalmente da minha condição de ser solitário, eu não fui completo. Houve também quem me mostrasse por suas ações o meu equívoco em generalizar as pessoas. Elas me deram provas de que existe sim algo de bondade dentro de nós, seres humanos, ou seja nem todo mundo é um/a filho/a da puta mesquinho/a. Hoje, por causa delas, eu pondero a severidade com que julgo os outros. Isso foi e tem sido muito importante para mim, pois eu não acho legal cultivar sentimentos perversos. Eu sempre pedi a Deus que não me deixasse ser perverso, apesar dos pesares.

Posso dizer que 2011 foi um ano de realizações. Eu tive experiências que não julgava poder ter ou fazer. Passei por poucos apuros. Acho que também exercitei a previdência. Quando se está sozinho, consegue-se exercitar tanto que passa a ser preocupante... mas, no final das contas, eu permaneci respirando. 

Por falar nisso, acho que reclamei menos das coisas e me esforcei para adotar uma postura mais realista - menos mimada - a respeito do mundo. Não sei se consegui, porém isso refletiu-se nas coisas que disse e escrevi. Provavelmente, os momentos com a filosofia budista tenham trazido isso para mim. O Budismo, que pude conhecer mesmo em 2011, trouxe-me a noção de que não tenho de ter culpa por coisas que eu não causei (ou não causo). Cabe falar que este foi o ano de descobertas. Foi um ano espiritual, com certeza, meditei em templos budistas, conversei com espíritas, dancei em encontros hare krishnas. Eu comi, bebi, fumei, viajei. Eu experimentei. Aliás, essa é uma das coisas pelas quais ficarei bastante orgulhoso de 2011: eu não me furtei à novidade. Colocar-me aberto às experiências faz parte do acordo que fiz comigo mesmo quando reuni esforços para esta Caminhada. 

Do meu modo, estou vivendo. Eu digo "do meu modo" porque sou consciente dos meus limites, por isso, também em 2011, comecei a praticar a aceitação de quem sou eu, das minhas peculiaridades; posso dizer, comecei a me respeitar mais, apesar de vacilar bastantes vezes. Despertei, neste ano, para o fato de que há coisas em mim que não precisam mudar porque são a minha essência. Observando atentamente, elas são duplamente boas e ruins, constitutivas do que hoje eu sou - e que ainda não conheço. Percebi que preciso mesmo é aprender, durante toda a minha vida, a balancear energias. Talvez, seja essa a minha grande experiência humana.

Em 2011, eu senti o meu coração mais pesado. A poesia não teve tanto espaço na minha vida. A sua última expressão física foi em maio, quando, por meio de uma brincadeira, fantasmas do passado vieram me assombrar. Eu decretei, dali em diante, que só a concretude da prosa me acompanharia: ela poderia assumir contornos poéticos, mas seria calculada, precisa e contida, sem os arroubos permitidos no poético. Não escrevi mais poemas. Não os escreverei até o que eu espero chegar. Eu me deparei com o início do meu desprezo à humanidade, na verdade, a determinada parte dela. O sentimento tem sido um confronto constante. Venho tentando não odiar, não espalhar sentimentos daninhos. Penso, às vezes, se se trata de um ódio gratuito, mas, em seguida, vejo que não é tão "gratuito", posto que a cada representação midiática, a cada notícia de jornal, eu noto os posicionamentos de superioridade dessa camada social infame. Logo, eu sinto um quê de abominação e de confusão, pois tenho de conviver com exemplares mais ou menos parecidos com esses seres humanos cotidianamente. Por isso, senti-me bastante sozinho, pois não consigo ser contraditório o suficiente para louvar o que não aprovo. Foi ano de sofrimento também. 

Ah! O medo veio menos, mas esteve presente. Engraçado, eu não me lembro de situações extremas de medo em 2011. Acredito que devido à situação em que estive - no início do mestrado, viajando e fazendo o que profissionalmente me dava prazer - a esperança de um futuro tomou o lugar do medo. Eu, durante boa parte de 2011, estive vendo o quanto poderia crescer, o quanto a vida prometia para mim, quantas coisas eu poderia aprender, estar em contato etc. Como disse, estava dentro de um mundo novo, podendo agir do modo que eu acreditava. Nesses últimos meses, no entanto, é que ele voltou. O tempo de início passou e estou indo para o meio dos meus estudos: isso implica mais perto do fim. Ultimamente, venho me sentindo inseguro porque vi o que é viver sozinho, construir as coisas por mim mesmo e gostei. Tenho medo de não conseguir o que quero, de ser mais um com um título e nada mais... Brasília me trouxe tais sentimentos. Eu pude, morando um ano inteiro no Plano Piloto, ver o quanto ser parte das suas lubrificadas engrenagens. Fiz um ano aqui vendo como a cidade vive em uma bolha, muitas coisas aqui não condizem com a realidade, para o bem e para o mal, no entanto ela permanece plácida e concreta. Vivo em uma relação de amor e ódio por talvez ter encontrado nessa Brasília um espelho de um lado que ainda não superei. 

Por outro lado, a despeito desses medos, percebo o quanto consegui por estar disposto. É como se eu pudesse fazer qualquer coisa, mas se, ao mesmo tempo, houvesse um lado que me puxasse para a realidade do tempo e das limitações. O medo dos últimos meses vem no eco das diversas pessoas destacando o quanto é pouco dois anos para a pesquisa de mestrado. Tais lembretes tilintam que daqui a algum tempo estarei em um novo processo de início. Reside nisso o problema: eu não gosto da ideia implícita nos recomeços, a de sofrer para crescer. A felicidade tem estado tão próxima de mim que tenho a vontade de aprisioná-la em uma gaiola de eternidade. Mas tudo isso é só figura. Eu sei que vivo e vivo em um mundo real, no qual a felicidade é um situação de espírito. Eu conheço, temo e ainda tento fotografar o efêmero e o inconstante. Acredito que em 2012, depois de aceitar o conceito, deverei desenvolver e atentar para isto: a presença do devir.

Aconteceu, em 2011, o resultado das coisas descritas acima. Aprendi a ter orgulho de mim. Eu expressei  diversas vezes - inclusive aqui -, pois eu preciso de aceitação, mas isso deve partir primeiramente de mim mesmo. Houve momentos nos quais eu precisei fazer escolhas e eu pensei sempre, e primeiro, em mim; questionei-me se estaria sendo eu ou o que outros queriam que eu fosse. Eu iniciei a batalha para ser proprietário do meu território, para prestar menos atenção no que os outros dizem - eu enfrentei alguns/mas engraçadinhos/as, inclusive -: isso foi bom. Por muito tempo, eu não tinha noção do que eu realmente era  nesse mundo; vejo que estou na direção de iniciar a compreensão.

Acabei de olhar as últimas postagem de 31 de dezembro dos últimos dois anos. Observei que eu costumava fazer planos para o futuro. Depois, em 2010, não houve necessidade, pois estava super entusiasmado pelo fato de um ano que prometia, 2011. Enfim, para 2012, sinto que terei dois caminhos. Eu com 26, ou seja, cronologicamente, mais maduro, poderei seguir em uma direção sorumbática, afastada e descontente com o mundo, ou irei em uma rota de cada vez maior entrega ao que quero e aos meus desejos, sem temor vampírico do que virá. Sinto isso agora o meu eterno pêndulo, cujas forças oscilam em me puxar para um lado cartesiano e estrito em oposição ao lado dos prazeres da juventude e da abertura. Acredito que um dos meus maiores desafios será o de encontrar um meio termo, pois não me vejo, hoje, abrindo mão de nenhum desses lados. Ou seja, eles são partes de mim. O meu eu, o que eu sou.

Este blogue foi de grande utilidade em 2011, pois não sei se existem pessoas capazes de ouvir tudo o que eu coloco aqui. Eu também me senti bem desconfortável com algumas coisas que dizia, aconselhava, (principalmente), enfim, eu não me vi em posição de sinalizar caminhos a ninguém, visto que sou um poço de coisas mal resolvidas ainda. Já, aqui, no blogue, eu tenho como escrever, ler e me entender a fim de avançar. É um diário de bordo da viagem utilíssimo porque se transfigura em bússola também. Fico feliz por neste ano eu ter tido tempo para escrever as coisas que queria, de relatar experiências que não sei bem para onde vão me levar. Agradeço a oportunidade de ter como não enlouquecer.

E 2011 vai assim para mim. Este fim de ano passarei sozinho porque não me sinto boa companhia para ninguém que gentilmente tenha me convidado. Todos estarão "muito felizes" para mim. Eu não estou assim. Eu fico me dizendo "Pablo, não seja ingrato, veja o quanto você conseguiu em um ano", mas, depois, vejo que não estou sendo mal agradecido, de forma alguma. Acontece que sou humano, naturalmente eu quero mais. Se eu não quisesse além do que tenho, definitivamente, não estaria aqui, agora. Eu me esforço para ter uma relação (da minha parte) verdadeira e clara com Deus; desse modo, tem coisas na minha vida que estão "bem, obrigado!", mas há outras que não, e não posso fingir que elas não existem ou que tudo está perfeito, porque não está. Eu já deixei para trás aquela fase em que eu fazia de tudo para ser o bonzinho da história, o conformado com o que há de bom. Não mais. Mesmo que termine sem ninguém, não posso voltar atrás. Eu ainda me sinto sozinho, e não é estando com casais e famílias fofos que me sentirei diferente. Isso é uma questão que terei de resolver, eu. Ninguém merece fingimentos. Eu ainda acredito que a virada de ano deve ser um momento repleto de energias boas e boníssimas. A minha não está. 

Agora falta pouco para as 13h. E acordei para escrever. Resolvi dar adeus ao ano que, até agora, foi o mais importante para a minha construção e evolução. Não sei o que virá em 2012, mas, é claro, que espero coisas interessantes e iluminadoras de direção. Espero encontrar quem me entenda de algum modo e que precise ser entendido, que me atenda e precise de atenção. Eu sei que o que quero resvala no idealismo, mas depois de um ano azul escuro, eu preciso de outros matizes. Eu preciso. 

Eu acredito sim em 2012. Enquanto haverá diversos lábios desejando "Feliz Ano Novo", hoje, eu, em algum lugar, só, esperarei e pensarei no meu novo ano, a nova Estrada que se desenha a minha frente. Só sei que preciso estar alerta para seguir. Seguir...

A todos de boa vontade um 2012 cheio de Luz. Àqueles de má vontade, vão ouvir música, vão ouvir Vaca Profana... Que todos se amem e, também, me amem. Amém!

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Listo

fonte: You Tube

[Agora uma frase que ninguém falou nessa iminência de fim de ano:] 2011 está acabando [Hahahaha!]. Esta é a sensação que me deu agora. Eu sinto como se uma parte do ciclo estivesse se fechando.

Hoje é o meu último dia aqui na casa de Jacque. Eu deveria estar levando o resto das caixas e malas para a outra casa, mas não sei o que passa: não estou com ânimo, só quero aproveitar o friozinho desse dia. O tempo também está de um modo preguiçoso. Acho que eu e ele estamos relutando em mudar, de alguma forma.

Eu sinto que estou indo para mais uma etapa da caminhada; estarei diante do que me dispus a buscar. Coisas minhas, coisas que eu, e, talvez, só eu entenda. A questão é que esses meses na casa de Jacque me serviram como um verdadeiro unguento, posto que me sentia intoxicado no lugar onde estava. Foi também o meu universo particular, no qual eu pude correr sempre que me cansava de um dia puxado na universidade. A casa também  foi um terror para mim também; foi uma espécie de metáfora para a vida, mostrando-me que a solidão é uma das coisas mais terríveis para um ser humano. Aqui, eu pude perceber como pode-se ter tudo, viver cercado de todo o conforto, mas ser extremamente vazio, e isso não é bom, definitivamente, não é. Como já cantou Luther Vandross, a House is not a Home. Quando se está sem presença de pessoas físicas, nem sempre uma casa é um lar. Esta é uma das mais importantes lições que levarei daqui. 

Encaro essa experiência como mais um modo de Deus sinalizar para mim direções, coisas que serão muito importantes para a minha vida. 

Enfim, eu me mudarei e, desta vez, terei de me preocupar com o mestrado. Este é outro ponto. Estive, ontem, conversando com um dos meus parceiros de casa (somos em quatro) sobre o ano. Ele falou sobre a rapidez com que, na sua impressão, 2011 passou e eu falei sobre como é engraçado o tempo em si. Há um ano, estávamos os dois pelejando para passar no processo seletivo e, agora, estamos prestes a nos tornar mestres: como se em um momento tivéssemos tudo e, em seguida, nada (é claro que falo do aspecto concreto de estar ligado a uma instituição, sem desconsiderar a carga intelectual que se consegue). Logo chegará a fase de escrever o texto da minha dissertação, pondo fim à minha trajetória de mestrando na UnB. Em certa medida, logo estarei indo em direção à estaca zero.

Às vezes, acho incrível essa possibilidade de não estar preso - sem amor, filhos, emprego - e poder aventurar cada vez mais - tipo, sair e tentar outras possibilidades em outros lugares -, contudo lembro-me dele, o Tempo. Logo estarei com trinta (putz!) e isso me faz pensar que preciso atinar como ganhar dinheiro para montar a minha vida, do jeito que quero. Adoraria relativizar e dizer que não vou me submeter às demandas da sociedade, mas não sou mais tão ingênuo assim: o meu idealismo já vislumbra os limites. Não posso desconsiderar que tenho necessidades e que elas são legítimas, afinal a ideia de vida que estou construindo feliz ou infelizmente está baseada nesse mundo nosso.

A partir de amanhã eu recomeço. Sempre faço isso. Ainda que soe presunçoso, em determinadas vezes, eu me sinto como que renascendo, assim vejo-me como uma espécie de fênix. Hahaha! Whatever!

Ainda tenho de ir ao supermercado e comprar umas coisas para aqui e para lá. Lá, o meu novo lugar. Lá vou eu. Estou pronto para mais uma partida.

É isso. foi um prazer estar neste lugar, na casa de Jacque. Vou indo...

domingo, 25 de dezembro de 2011

Natal com efeito

Dia 25. Já é Natal. Eu estou em casa com as luzes apagadas, ouvindo Cordel. Ah! Eu recebi um presente. Unforgettable... Portas estão fechadas, portas estão abertas. A casa está fechada, mas a minha consciência foi expandida, ela está aberta. Há poucos dias que eu a venho abrindo. 

Escrever. Aqui sou eu e eu posso muito ser eu. Estou cansado de ser nada mais do que o que conheço. Saturado. Hoje estou com vontade de ser outro, de encontrar outros e de, alguma forma, ser o que a minha cabeça limita, pois ela não tem fronteiras. Eu penso nos fios que sustentam os meus membros e como há momentos nos quais eles se tornam físicos, tendo a perda do viço e da força como essência. Os fios, então, insignificam-se; é como se eu os pudesse romper. Sei que tudo isso gera-se da imaginação de uma aventura cuja narrativa tomei por credo. Eu vi a minha vida de modo tão desconcertante que pareceu que não voltaria a ser quem eu julgava ser: Eu-Alice e a Lagarta Azul em conexão com Eu-Claudia aprendendo com Lestat, sob os cuidados de Louis. Em certo momento, todo e qualquer ferimento suavizou, cicatrizou. E, com efeito, a presença de cicatrizes une no concreto passado e presente. Agora, passar a mão na cicatriz me faz estar alerta a como as coisas não têm de ser iguais por tempo indeterminado. E eu penso nos fios, nos fios que, apesar de estarem físicos, ainda são tênues fios. Eu nunca deixarei de tê-los porque toda a gente nasce com fios, e mesmo aqueles que pensam ser livres dos fios estão bastante atados a fios. Só as cores é que são mudadas, acho. 

Eu, nesses úlitmos dias, deslizei pelos fios, senti-os, lambi-os. Estive onde nunca estivera. O sabor e a delícia de experimentar tapas de liberdade, e viajar, derivar em montanhas russas nas distorções de A day in the Life... Sim. Foi boníssimo. Abri as janelas. Experimentei a bonança. Agora, quero saltar e passar longe dos quadros e dos quadrados. C'est ma vie. Qual um gatinho cinza, estou encarando a permissão de viver uma vida minha. Neste Natal eu estou me dando isso.


Neste dia 25 de dezembro, não estou com nada além das minhas sensações de viajante. Eu, que aceitei o passaporte de efeito, estive sob efeito, eu viajei, foi bom, apesar do medo, foi bom. Eu ri muito, eu levantei mais alto os braços e me mostrei sem medo à vulnerabilidade. Eu. Ninguém precisou saber, poucos sabiam da minha viagem, ninguém sabe da minha viagem. Agora vejo que posso não ser tão mais prendido a ponto de pensar só nos fios. Quero mais é brincar com eles, experimentar toda a sua elasticidade, apesar de saber que seu contorno pode vir a assumir o de corda bamba. Hahahaha! Eu morro de medo dessa situação de instabilidade, mas vozes me dizem "vai ficar tudo bem". Sussurros. Não sei. Lembro-me bem dos fractais, dos círculos, das estrelas, das bolas de fogo púrpura; eu no carrinho de roda gigante, mergulhando em um túnel escuro e falando, falando, falando sem parar; não havia sol, mas a sede... Que sede! Minha boca extremamente seca, eu sentindo, em excesso. Eu senti de mais. Senti o corpo leve e a boca seca. 

Neste Natal estou diferente. Outro, após sensações nas minhas terminações pulmonares. Inesquecível. Chamava com a boca; a magia, assim, entrava; eu segurava a passagem dentro de mim e libertava todo o espírito no aaaaaar: fios voavam no vento, como fios dos cabelos da mais linda cabocla contrastando com a sobreposição do céu e da grama. Eu descrevendo traços azuis, brancos, negros e um vermelho. Eu era azul, amarelo, branco e todo noites estreladas. Os meus olhos semi-cerrados e a necessidade extrema de falar, falar -  mesmo que não me escutassem -, falar. Eu estava de uma liberdade verbal incrível: minha língua infectada por verborreia. Hahahaha! Eu ria alto... "Shhhhh!", alguém me dizia... e eu ria mais, com a mão na boca: apenas a admoestação me dava a noção de que agia, de tempo e de espaço. Era de um riso bobo, eu me sabia bobo, e não tinha problema com isso. Incrível, não tinha tanto problema. A senha de acesso à terra de Lucy in the Sky with Diamonds, entendendo tudo e desconhecendo a razão.

Nada foi um sonho e hoje estou de volta à realidade. Natal. Questiono-me se quero permanecer, então. Sinto também ser hora de mais um esforço para sentir. Sem medo. Se pudesse, optaria por ter menos medo. Tem vezes que acho ser possível ter menos medo.

As pessoas mandam os votos de felicidades, pois é Natal. Eu queria estar tendo conversas cada vez mais e intensamente elevadas. Explico. Brincadeiras sabidamente codificadas nas palavras, pega-pegas de frases sinuosas, construções luminosas indicadoras de caminhos de conhecimento, o conhecimento do ser, enfim, semantizar e ser. Queria ouvir mais perguntas filosóficas, aquelas que não têm medo de encontrar abismos. Eu daria as mãos para quem quisesse pular nesses abismos e me levar (aonde eu pudesse, talvez, encontrar os campos azuis). Mas isso parece-me ser tão eu. Pergunto-me, então, se há gente assim, perdida em busca de abismos e de mãos para pular junto. É um mundo construído por mim belamente, contudo perigoso e limitado pelos velhos fios... who cares? Eu, por alguns dias, estive ouvindo, navegando Eternas ondas. Eu estive dentro de um barco etéreo, que meneava suave em um mar de vapor irresistível. Extrapolando o sensual, eu sorria. Sem problemas.


Como se um mundo estivesse plasmando-se nas minhas mãos, cada vez mais abertas, orientadas pelo ângulo do meu braço, ia rumo àquele outro lado que ninguém domina e nunca se dominará. Terra proibida. Um leve e indescritível sentir.      

Eu, neste Natal, imerso em brumas que uma vez me sustentaram. 

domingo, 4 de dezembro de 2011

Reizinho do mundo


Dezembro começou com uma novidade muito boa. Consegui vaga na residência da universidade. Isso implica viver dentro do lugar para onde vou (e estou) a maior parte do tempo; quer dizer que vou ter sossego em relação a uma das coisas que mais me entristece em Brasília: o preço (criminoso) dos aluguéis dos imóveis; e estarei no Plano Piloto, perto de tudo o que preciso por ora.

No entanto, junto com essa verdadeira graça que recebi, estão se criando "pesadillas" na minha mente. 

Acabo de vir da minha nova casa. Dormi lá. A paisagem externa é linda - com muitas árvores e jardins -, mas a casa é uma bagunça para os meus parâmetros. Eu dividirei moradia com mais três caras que vivem  com as janelas e as portas do apartamento fechadas. Cada um tem um jeito, mas parecem ser unânimes na questão de verem-se isolados em um mesmo espaço, com as suas portas e janelas cerradas. Apesar de ser compreensível o meu comentário a respeito do estado da casa (afinal, logo, estarei saindo de um lugar lindo, limpinho, organizado etc.), eu não me sinto bem apontando os erros dos outros, nem avaliando os demais... meu Deus! 

Eu estou mal porque, mais uma vez, andei praticando a minha faceta "mestre dos magos". Eu dando conselhos a outra pessoa. Nossa! Eu! 

Tento tomar cuidado com essas coisas de dizer "eu acho que você deveria..." ou me mostrar como quem tem o controle da situação, pois não sou perfeito ou completo; a minha vida, em vários aspectos, tampouco é um exemplo bem-sucedido. Estou meio exausto, cansado de estar sozinho; cansado de ouvir trombetas apocalípticas sobre o futuro; farto de, às vezes, ser do jeito que sou - e de me ver na iminência de querer vingança do mundo por isso. Não sei se se trata de não gostar de mim, eu tenho orgulho de mim, mesmo. No entanto, não sei, chego à conclusão de que sou bem estranho quando me vêm pensamentos super esquisitos de uma vida de solidão: vendo, ouvindo os outros vivendo, errando, e eu não. Por outro lado, eu tenho ciência de que muito do que olho e quero são construções, tipo ilusões, que, apesar de eu próprio tentar me convencer do contrário, vivo no anseio de encontrar a minha porção de ilusão. Acho que a maioria das pessoas vive para achar a sua própria porção de ilusão e se agarrar a ela: como não é concreta, torna-se impossível detê-la e tê-la de fato.

Acredito que as coisas complexas que estão na minha cabeça neste momento estão relacionadas ao fato da mudança de casa e por eu não estar conseguindo fechar este semestre. A trivialidade de estar com um texto por fazer e que simplesmente não sai me desestabiliza. Eu queria poder evitar situações de tensão nas quais as pessoas fazem qualquer coisa para se livrar de um fardo. Eu não queria ver o meu trabalho como um fardo. Além disso, eu me envolvi em uma atividade que está esgotando as minhas possibilidades de organização. Eu tenho pensado muito nessas duas coisas. Elas têm se afetado, e me afetado, ultimamente. 

Eu fico pensando em um modo de coexistir com os meus problemas de uma forma que não me atrapalhe, para isso, tento entendê-los, negociar comigo mesmo possibilidades de aceitação. É nessas tais possibilidades que eu falho. Pareço não aceitar certas coisas em mim e no mundo. A questão é a seguinte, se vejo em mim um problema, recorro à razão para tentar observá-lo; eu, usando do intelecto, reafirmo a característica da humanidade a fim de desenhar-me falível, porém, no fundo, estou em uma empreitada medieval de extinção de demônios: a razão me convence de que posso resolver determinado(s) problema(s), desde que eu me transforme em uma hipótese(!). Nesse estágio, a minha humanidade é reduzida pela pretensa inexorabilidade da minha razão, ou melhor, da razão. No desenvolvimento, surge uma camada em que eu critico esse tipo de pensamento objetivista, no entanto sob ela reside a minha total entrega à racionalidade suprema. Eu me vejo exercitando belamente a hipocrisia. Este momento, por exemplo, é mais uma tentativa de racionalizar um descontentamento.

Digo que exercito a hipocrisia - mesmo que sem ter determinada uma intenção destruidora por trás das ações - porque, racionalizando por meio da observação certos problemas, consigo construir modelos lógico-linguísticos que convencem o(s) outro(s) da minha "posição diferenciada" diante da vida. Em uma espécie de estratagema, havendo percebido que os meus problemas não são tão meus, que são recorrentes por serem puramente humanos - e, enquanto noto os outros sofrerem por não observarem essa característica -, aproprio-me da noção para de alguma forma sair vencedor de um jogo esquisito, no qual eu deterei os louros da diferenciação. É altamente relevante para mim estar atento a essa questão, posto que todo esse percurso é uma silhueta sedutora, guia do caminho terrível e enfeitado da vaidade (que empurra os seres humanos  no abismo da intransigência, da soberba e da arrogância). É quando eu estou a um passo de me tornar o dono da verdade.

Eu digo a mim - e aos outros - que essa tal verdade não existe, mas estou em uma sofisticada busca dela.  

É por essa razão que eu, às vezes, sinto-me mal por dar conselhos, muito embora eu ache que as coisas que penso precisam ser ouvidas por terem seu grau de virtude. Em verdade, apesar de me descrever meso-hipócrita, vejo que gostaria de encontrar pessoas que pensassem como eu penso, pois diversas vezes acredito piamente que partes da minha visão de mundo são as mais apropriadas em certos casos. Eu também quero um reino. Então, acabo observando que não sou tão diferente assim. Tudo isso me parece bastante humano. E, afinal, eu nasci e cresci em uma sociedade que nega a natureza, que foca na exatidão das formas, das medidas e, naturalmente, transporta o que as operações algébricas resolvem para as vidas. No entanto, somos células, fluidos e gases; vidas dentro de vidas. Não nos podemos controlar, além do imediato. É quando a fatalidade se mostra em sua forma mais crua: a possibilidade de organizar, mas sem poder controlar. Não sei se é o caso de me envergonhar por tudo o que expressei aqui, pois a minha tristeza não vai no sentido de querer extinguir isso - dado que a recusa à ideia da minha necessidade da lógica platônica seria uma própria recusa da minha inerente mediocridade megalomaníaca humana -, mas sim de me observar tão comum quanto quem não é, por exemplo, organizado com a casa (ou com aquele que parece desatento aos "benefícios filosóficos"). Devo refletir, nesse(s) processo(s), se eu também não estou fechando as minhas janelas e portas no estabelecer de julgamentos nos quais eu sempre serei o beneficiado, o eterno reizinho da casa.

É pelo fato de, sim, gostar de mim, que sigo atento.