segunda-feira, 3 de outubro de 2011

A semântica do cinza

Aqui em Brasília está cinza, assim como eu. Na verdade, estou em um intermezzo, em um tipo de espera de uma continuação. Há alguns dias queria ter vindo escrever, mas não rolou. Não está dando para fazer muita coisa, nesses últimos tempos de obrigações. Precisava, no entanto, disto aqui - assim como as plantas da janela da casa onde estou precisaram de água no tempo em que estavam de cor sépia. Com a Primavera, presenciei uma ressuscitação e, neste momento, é como se eu precisasse de um ressurgimento.

Sou eu às voltas com os meus pensamentos. Aquela longa e arrastada história. Não sei se este é mais um daqueles momentos que se vão quando me deparo com alguma "alegria de semana". No que elas, efusivas, passam, eu fico mal, de novo. Aí, fico pensando se isso acontece com todo mundo; cogito estar exagerando e, na maioria das vezes, acredito - ou me certifico de - que (boa parte de) tudo é minha culpa. Eu fico bastante cansado de ter a culpa só para mim, mas penso que talvez essa atitude tenha alguma correspondência com o fato de ser adulto, aquela coisa de arcar com as consequências, aguentar o tranco, fugir do espectro de um erê constrangedor. Tem dias que acho que não vou suportar o tranco. Hoje é um deles.

Eu deveria estar escrevendo um projeto para a disciplina de semântica, em uma segunda-feira, dia de responsabilidades esquematizadas por mim em um roteiro de estudos. Mas eu rodo, digito umas coisinhas furadas e me canso. Fico farto de tudo. Cólera direcionada aos livros que não dou conta de ler; à televisão que não para de passar as mesmas coisas; às pessoas de comportamento insuportavelmente lacônico. Desconfio de que estou em um momento crítico: eu de significados, tendo de lidar com sentidos. Vejo-me cercado de visões-e-visões-e-visões-e-visões-e-visões (e) de mundo(s)... Como a música da Calcanhotto, "(...) logo eu...". Creio estar vivenciando o chamado "desencantamento do mundo".

O fato é que as coisas parecem esquisitas. Estou totalmente inserindo-me no tempo, fazendo-me de Tempo, atado a prazos e datas e rotinas maquinantes. Um operador de atividades cíclicas. Estou me moldando a ser prático e objetivo, a abstrair apenas o que é proposto para mim como abstrato. Estou entrando em estruturas complexas que não entendo, mas devo seguir. Sinto como se a poesia fosse morrendo a cada dia em mim. Eu estou me debatendo porque eu sei que sou diferente. Não estou conseguindo lidar com essa diferença inserido em um mundo de pessoas tão iguais. Começam, então, as merdas de pensamentos circundantes e estéreis; questões que fogem do meu controle, mas que eu quero que aconteçam a todo custo. É um mergulho dentro do mundo que eu mesmo criei, mas que não se desenvolveu. Um feto que está formado, pronto, que não vingou e que, ao mesmo tempo, não se caracteriza propriamente como um aborto. O não-lugar. É como se em um ambiente quadridimensional e inexplicável,  frames fossem passando - agilíssimos em seu tempo - sob a minha percepção pasmada: sequências imagéticas atrativas a mim, mas que me enganam, que me seduzem a entrar em cada um delas e que, em simultâneo, frustram-me por serem apenas partes incompletas de um todo maior, cuja constituição integral não suporto aguardar. Eu me percebo, então, construindo períodos imensos. Não posso viver em um frame; eles passam. Precisam passar.

Eu sou alguém que, talvez, não aprendeu a seguir. Eu sou alguém que está preso a coisas que não existem ou já se estão diluindo. Como uma daquelas maldições de histórias epopeicas: um jovem nobre sentindo algo fantástico diluir-se entre seus dedos, perplexo na agonia de sentir e não saber o que está indo embora. Tão perto e tão longe. Mas eu, ao acordar e pegar um desrespeitoso ônibus, vejo que  não sou um príncipe. Até sair do meu castelo, eu sempre tive a certeza disso. Ávido e seguro, eu possuía essa minha verdade. Hoje, sou de carne, osso e sentidos.

Daqui a um tempo o ano acaba. 2011, 2012... Eu, que sempre quis ser realeza, vejo como o mundo é diferente do reino que pintei. Isso tem algo de positivo, some say... Afinal, tudo pode ser bom, divino, maravilhoso. 

E os quadros passam; um, que, logo, torna-se dois, três, quatro etc. Então, deixo de ver desenhos de paisagens pinceladas para interpretar os fenômenos como cinéticos, observados em construções longe, lineares e cinzas, da cor do céu de uma terra ressecada, que assume dimensões novas, não imaginadas, mas ainda assim concretas e sensibilizadas somehow. Eu em mais um período longo, o qual preciso escrever, o qual preciso viver.

Eu, amante devoto do Tempo.

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